Autor: Samuel Wallace MacDowell
A primeira conferência intergovernamental sobre educação ambiental ocorreu em Tbilisi, na Geórgia, em 1977. Nela foram elaborados e dispostos as finalidades, objetivos os princípios básicos da educação ambiental. De uma forma resumida estes têm como objetivo proporcionar aos mais diversos segmentos da população compreender as causas dos problemas ambientais, preveni-los quando possível e buscar soluções para estes utilizando-se das diversas ferramentas disponíveis, sejam estas tecnológicas, econômicas, sociais, etc., adequadas a cada contexto. A conferência também convida para o uso sustentável dos recursos naturais e a um gerenciamento efetivo do meio natural nos planos de desenvolvimento e crescimento.
Dentro deste contexto é de extrema importância o processo de integração da sustentabilidade socioambiental dentro das empresas e corporações, por serem estas, direta ou indiretamente, as principais responsáveis por grande parte dos problemas sociais e ambientais que vêm ocorrendo no planeta. Embora, em uma visão superficial, possa parecer que não exista nenhuma ameaça ao planeta maior que as empresas, existem autores importantes que pensam diferente. Para Ken Wilber, por exemplo, um dos maiores filósofos americanos, fundador do movimento Integral, as empresas não são os principais inimigos da sustentabilidade, mas, pelo contrário, podem vir a ser uma das maiores esperanças para o meio ambiente. Seu argumento é simples. As empresas não passam de um meio eficiente de mover e trocar bens e serviços. No entanto, o que vai determinar a forma como isto é feito é o nível de consciência daqueles que as dirigem. Muitas empresas atualmente vêm demonstrando uma preocupação cada vez maior com a questão da sustentabilidade, seja por pressão de acionistas e consumidores, questões de conformidade legal, possibilidades de maior competitividade e até mesmo, em alguns casos, por questões genuinamente éticas. O presente trabalho tem por objetivo analisar as conclusões de um estudo feito junto à dez corporações, com faturamentos na ordem de bilhões de dólares, sobre a maneira como a consciência socioambiental está sendo incorporada a estas empresas, e como essas conclusões podem ser utilizadas para aprimorar a educação ambiental em geral.
O estudo, intitulado “Avastone Corporate Sustainability Study”, conduzido pela empresa de consultoria “Avastone Consulting”, teve como objetivo examinar a maneira como as organizações estão buscando reconciliar seu papel no mundo, hoje e no futuro, no que diz respeito à sustentabilidade. Para isto, a empresa mapeou o grau de engajamento de dez corporações, em uma escala composta de cinco níveis de sustentabilidade, representando estágios de atividades desde as mais rudimentares até as mais complexas, denominados 1.0 Cumprir (conformidade com a legislação e filantropia), 2.0 Voluntariar (redução de impactos e eco-eficiência), 3.0 Associar (gerenciamento de risco, co-evolução de soluções com parceiros e construção de reputação), 4.0 Integrar (ênfase em estratégias de integração nos processos e sistemas da empresa e ação integrada ao longo da cadeia de valor) e 5.0 Redesenhar (mudanças radicais nos sistemas de finanças, de mercados e nos modelos de negócios a favor da sustentabilidade). Os resultados mostram que as organizações estão operando predominantemente entre os níveis 1.0 e 3.0 de sustentabilidade, embora todas tenham um profundo reconhecimento da importância da sustentabilidade e uma sólida intenção de subir pelo menos um ou dois níveis. Embora todas tenham como objetivo final alcançar o nível 4.0, nenhuma delas reconhece o nível 5.0 como sendo relevante para os negócios.
Embora vários fatores tenham sido considerados importantes para se atingir as metas de sustentabilidade, tais como valores compartilhados e ética, princípios orientadores, determinação de objetivos, monitoramento e comunicação, comprometimento das pessoas envolvidas e a criação de estruturas organizacionais de apoio, o que mais pesou foi a questão da liderança. Para analisar estes fatores, foi utilizado o sistema “AQAL”, desenvolvido pelo já citado filósofo Ken Wilber, por oferecer uma representação mais completa dos múltiplos aspectos da realidade encontrados em qualquer situação ou acontecimento. Embora o sistema seja complexo e utilize uma diversidade de aspectos, neste estudo foram utilizados somente dois, os quadrantes e os estágios de consciência. Os quadrantes oferecem quatro perspectivas universais que, juntas, permitem uma compreensão abrangente de qualquer situação, inclusive da sustentabilidade. As quatro perspectivas descrevem o interior e o exterior de indivíduos e coletividades (grupos, organizações, sociedades, etc,), sendo que interior se refere às dimensões subjetivas da realidade e exterior às dimensões objetivas. No contexto deste estudo teríamos portanto 1) interior individual (experiência, atitude, motivação e engajamento), 2) exterior individual (comportamento, performance, competências e habilidades), 3) interior coletivo (cultura, visão de mundo, valores compartilhados e ressonância). 4) exterior coletivo (sistemas, estruturas, processos, objetivos e monitoramento). A análise mostra que todos os quadrantes são importantes para se atingir a sustentabilidade. Além disto, dois padrões emergiram como sendo significantes para o sucesso. O primeiro é que o foco nos fatores interiores (43%) é tão importante quanto o foco nos exteriores (57%). O segundo é que embora fatores orientados para sistemas sejam essenciais (40%), estes por si só não são suficientes, sendo necessário também considerar fatores orientados para o comportamento, a cultura e a experiência individual (60%). No entanto, para que esta abordagem multidimensional seja efetiva é necessário que todos os quadrantes sejam reconhecidos, o que em geral não acontece. Uma vez que os quadrantes são diferenciados e reconhecidos, fica mais fácil direcionar os esforços no sentido de integrá-los como um todo na estratégia das corporações.
Mas talvez o resultado mais importante desta pesquisa seja que as mudanças exteriores realizadas, ou seja as formas que as atividades e a sustentabilidade tomam, refletem diretamente as capacidades interiores, ou seja, a atitude mental ou estágio de consciência das pessoas envolvidas, principalmente das lideranças. O grande desafio, portanto, está na capacidade de reconhecer e visualizar as diversas atividades necessárias para promover e integrar níveis de sustentabilidade crescentes e torná-las realidade a partir de ações concretas. Isto depende, também, da capacidade que as lideranças tenham em transmitir esta visão em termos que toda as pessoas envolvidas possam entende-la, ao mesmo tempo em que são capacitadas à agir de forma efetiva. Portanto duas questões estão envolvidas aqui. Uma é a capacidade de desenvolvimento horizontal, isto é, a aquisição de conhecimentos, habilidades e técnicas dentro de um mesmo nível de consciência, e outra a de desenvolvimento vertical, ou seja a capacidade que os indivíduos têm de expandir sua visão de mundo, abarcando níveis de compreensão da realidade cada vez mais amplos, tolerantes, complexos e integrados (expansão da consciência), permitindo um funcionamento cada vez mais efetivo num mundo complexo e dinâmico.
Embora este estudo esteja direcionado para a questão da sustentabilidade em grandes corporações, acredito que ele trás importantes lições para a educação ambiental em geral.
Quando se olha atentamente para o movimento ambientalista, percebe-se que, apesar de haver uma certa convergência na questão da preservação ambiental, ou seja dos ecossistemas e dos serviços prestados por estes, há grandes divergências em relação aos conceitos de sustentabilidade e aos meios para alcançá-los. Apenas para citar alguns exemplos, temos os eco-capitalistas, os eco-socialistas, as eco-feministas, os bioregionalistas, a ecologia social, a ecologia profunda e, mais recentemente, os “verdes brilhante” (ou cybergreens), um grupo radical de ambientalistas que acredita que a única forma de se efetuar as mudanças necessárias no sistema econômico-político para torná-lo sustentável seja através do “redesenhamento” consciente de toda a base material da nossa civilização, através de novas tecnologias, inovações sociais mais amplamente distribuídas, alta densidade urbana, prosperidade crescente e “consumismo verde”. Nas palavras de Sterling, um dos seus fundadores: “Os cybergreens estão vencendo, porque, contrário ao resto do movimento ambientalista, eles não dizem respeito ao potencial espiritual, à decência humana, ao pequeno é bonito, paz, justiça ou qualquer outra coisa inatingível. Os cybergreens dizem respeito ao que as pessoas querem, tais como saúde, sexo, glamour, produtos “quentes”, inovações tecnológicas, banda larga estonteante e muito dinheiro!”
Sem querer tomar nenhum partido, a minha opinião é que a educação ambiental leve em consideração toda essa gama de abordagens divergentes. Vemos aqui amostradas diversas visões de mundos, cada uma refletindo um nível de consciência diferente, com maior ou menor foco em um ou mais dos quatro quadrantes descritos anteriormente. Isto implica numa compreensão integral da evolução do ser humano. De acordo com a visão integral o desenvolvimento da consciência se dá do egocêntrico para o etnocêntrico para o globocêntrico para o cosmocêntrico, abarcando cada vez mais a totalidade e a complexidade da existência. No entanto, muitas vezes percebo uma certa ingenuidade na educação ambiental, um idealismo simplista e as vezes retrógrado. Não temos como voltar ao passado.E nem haverá uma única solução para os problemas existentes. Por isto acho que, muito mais do que educadores, devemos ser facilitadores do desenvolvimento humano, tanto no sentido horizontal (conhecimento) quanto vertical (evolução). É esta informação que devemos passar para as pessoas, de que podemos evoluir, de que a medida que nossa consciência se expande nossa visão de mundo também se amplia, de que existem diversos conceitos de sustentabilidade e que todos devem ser respeitados, embora claro, tenhamos todo o direito de analisá-los, concordando ou não com eles. Assim a educação ambiental se torna muito mais uma escolha do que uma verdade absoluta passada de cima para baixo. Talvez assim, quem sabe, tenhamos mais chances de atingir um maior número de pessoas.
Referências
– Leadership and the Corporate Sustainability Challenge: Mindsets in Action Report – http://www.avastoneconsulting.com/MindsetsInActionReport.html
– Integral life – http://integrallife.com/
– Bright green environmentalism – http://en.wikipedia.org/wiki/Bright_green_environmentalism
– A Brighter Shade of Green – http://www.worldchanging.com/press/Worldchanging_WIE.pdf
– Ken Wilber – Sustainability and Business: Friends or Foes? http://integrallife.com/apply/environment/sustainability-and-business-friends-or-foes