Diziam que o Seu Vicente, prestes a completar 84 anos, estava fora do seu melhor juízo quando decidiu comprar um pedaço de terra a 200 km de São Paulo para plantar árvores.
Em entrevista para o programa Outlook, da BBC, ele disse que as pessoas riam da sua cara, porque ele não viveria o tempo suficiente para comer as frutas das árvores, que demorariam pelo menos 20 anos para crescer.
“Eu respondia: ‘Vou plantar essas sementes, porque alguém plantou as que estou comendo agora. Vou plantá-las para que outros possam comê-las’.”
Vicente comprou o terreno em 1973, no auge da Ditadura Militar. Naquela época, a fim de impulsionar a agricultura, o governo oferecia facilidades de créditos para investimentos em tecnologia agrícola. Mas Vicente não queria transformar seu pedaço de terra numa pastagem.
Vindo de uma família de agricultores, a expansão da atividade agrícola lhe causava desconforto e preocupação, pois os campos destruíam a fauna e flora locais, além de afetar a oferta de recursos hídricos.
“Quando era criança, os agricultores cortavam as árvores para criar pastagens e pelo carvão. A água secou e nunca voltou”, lembra.
“Pensei comigo: ‘a água é o bem mais valioso, ninguém fabrica água e a população não para de crescer. O que vai acontecer? Ficaremos sem água’”.
Aos 14 anos, Vicente foi morar na cidade, onde trabalhou como ferreiro. Foi com o dinheiro da venda do seu negócio que ele comprou 30 hectares em uma região de planície perto de São Francisco Xavier, distrito de 5 mil habitantes que faz parte do município de São José dos Campos, no interior de São Paulo.
A vida na cidade foi nada fácil: “Acabei tendo de viver debaixo de uma árvore porque não tinha dinheiro para o aluguel. Tomava banho no rio e vivia debaixo da árvore, cercado de raposas e ratos. Juntei muitas folhas e fiz uma cama, onde dormi”, diz Vicente.
“Mas nunca passei fome. Comia sanduíches de banana no café da manhã, almoço e jantar.”
Depois de voltar para o campo, ele começou a plantar as árvores que hoje formam uma floresta tropical com cerca de 50 mil unidades!
“Em 1973, não havia nada aqui, como você pode ver. Tudo era pastagem. Minha casa é a mais bonita de toda essa região, mas hoje não se pode tirar uma foto desse ângulo porque as árvores a encobrem, porque estão muito grandes”, conta orgulhoso Vicente.
A floresta trouxe de volta os animais: “Há tucanos, todo tipo de aves, pacas, esquilos, lagartos, gambás e, inclusive, javalis”. “Temos também uma onça pequena onça e uma jaguatirica, que come todas as galinhas”, brinca.
Mas o que deixa o Seu Vicente mais feliz é que os cursos de água voltaram a brotar. Quando ele comprou o terreno, só havia um – agora, há cerca de 20.
Com informações do G1 / Fotos: Gibby Zobel