Autoria: Roberta Celestino Ferreira
A sociedade contemporânea, com a emergência mundial da crise dos paradigmas, é um terreno cheio de armadilhas, pois as contribuições neste campo estão em constante criação. As transformações próprias do mundo contemporâneo: a telemática e as influências da mídia, as transnacionais e as estratégias de fluxos de capitais, as megalópoles, a desterritorialização da identidade, a bio-indústria, a tecno-estrutura centralizando poderes políticos, significam para um pesquisador atento, uma explosão das fronteiras antes fixadas nos paradigmas do conhecimento.
Fechar os olhos a estas transformações, não implica unicamente em uma ignorância sobre nossa própria época, mas significa perpetrar a continuidade do estado atualmente existente, desta forma a responsabilidade aumenta para os profissionais da chamada área das ciências humanas, que deveriam ter um papel crítico neste processo. A produção do conhecimento científico enquanto sistema racional submetido a leis – determinadas – forjou-se em um processo histórico, fundando instrumentos conceituais considerados preceitos universais e inquestionáveis. Não estamos mais no momento das determinabilidades científicas, a existência de uma imprevisibilidade tornou-se matéria intrínseca do conhecimento científico e sob este signo nós estamos inseridos. Todo pensamento e qualquer que seja o seu objeto é apenas um modo de fazer social-histórico.
O saber moderno e científico que se pretende construir a partir dos intricados relacionamentos entre o homem e seu ambiente, está imerso nos turbilhonamentos da interdependência, precisamos superar as fronteiras disciplinares e as trincheiras de especificidades que impedem uma visão horizontal dos relacionamentos contidos na frágil teia da vida. A interdisciplinaridade, processo de inter-relacionamento de várias disciplinas científicas possui um aspecto essencial na constituição do pensamento ecológico, possibilitando-o estudar as dinâmicas relações estabelecidas entre as espécies animais e o seu ambiente orgânico e inorgânico.
A ecologia, segundo nossa compreensão, é um campo de conhecimento que está fundamentado no estudo do funcionamento das relações estabelecidas entre as espécies bióticas e os elementos abióticos formadores de um ecossistema, ao qual compreendemos como um complexo relacionamento desordenado, interativo, dinâmico e constante de energia e matéria nos meios físico e biológico, possuindo uma capacidade auto-organizativa e reprodutiva, que permite a geração e manutenção da vida. Em determinados momentos privilegia estudos sobre processos voltados totalmente às correlações fisio-bio-químicas de organismos vivos, os quais não receberam influências humanas para alterar suas características principais.
Os elementos naturais que integram e formam esse sistema são constantemente reaproveitados em ciclos vitais, gerando um equilíbrio auto-regulado pela ampla diversidade de elementos e interdependência entre eles. Este complexo não pode ser reduzido a simplesmente uma análise particularizada dos elementos que o integram, mas deve ser entendido por inteiro, isto é, aos relacionamentos de todos os elementos que o compõe. Em um ambiente fechado quando há rupturas em seu movimento, surge o perigo evidente de destruição do mesmo, nesse sentido o homem e suas atividades, ambos determinados historicamente e imersos no meio ambiente, podem contribuir para aumentar as probabilidades deste evento, ao explorá-lo a uma velocidade ou intensidade que quebre a sua estabilidade. A ecologia, enquanto ciência tem como princípio que tudo está relacionado com tudo, mas em determinadas pesquisas existe uma ênfase mais profunda dos aspectos naturais – funcionamento da natureza, ou sociais – das sociedades humanas com a natureza. No decorrer do século XX, esta disciplina científica ampliou o seu campo de influência não se restringindo mais apenas ao campo das ciências naturais e abrangeu as ciências sociais. Como o ecossistema abrange o mundo natural, e o homem dele faz parte, pode-se inferir que neste processo dinâmico o ecossistema é uma relação social, pois está intrinsecamente integrado às ações humanas.
A ecologia, quando enfatiza as relações estabelecidas entre o homem e a natureza, recebe a denominação de ecologia humana. Da aplicação orientada deste conhecimento na sociedade, deriva a ecologia política. Pode-se explicar esta interação através do entendimento do dinamismo e da complexidade dos sistemas naturais, os quais por sua vez estão intrinsecamente ligados às formas de como a sociedade humana estabelece as suas relações e modos de produção. É isto que a diferencia no processo histórico. A visualização ecológica da relação homem-natureza, contribuiu na constituição de um pensamento político, que se posicionou criticamente as consagradas estruturas de produção, degradadoras do ambiente. A Ecologia Política surge enquanto fruto emergente deste processo, que ao utilizar-se das concepções ecológicas, proporciona o surgimento de uma dimensão crítica diferente à sociedade industrial: reconhecendo o homem enquanto portador de desejos e valores culturais e não meramente como um mecanismo na engrenagem da maquinaria, opondo a noção de melhor Ser à do mais Ter, questionando a natureza e o desenvolvimento dos meios de produção, contrapondo a dimensão incalculável da vida ao reducionismo econômico, criticando o fato de que neste sistema se vive para produzir, e não mais se produz para viver.
Com o intuito de tentarmos contribuir com as perspectivas em aberto que tratam desta abordagem, optamos por realizar o percurso de buscarmos compreendê-la pela forma de como ocorreu à constituição da ciência moderna num entrelaçamento eco-histórico. A ciência moderna realiza uma ruptura na relação homem-natureza, "desantropomorfizando" a natureza e concomitantemente "desnaturalizando" o homem. A partir de um movimento unívoco, a ciência cinde em elementos dicotômicos e constroem a partir disso um gigantesco aparato intelectual, resultando em um controle e numa instrumentalização da natureza objetivando auferir benefícios determinados pelo próprio homem. As escolhas tecnológicas são primordialmente opções políticas, que atendem hegemonicamente interesses dos setores dirigentes, para a resolução de seus problemas, de aumentar a concentração de poder e de renda, pela maximização da produtividade e do capital, no enfrentamento da contestação dos trabalhadores, usufruindo intensivamente do meio ambiente. Com o poder da gestão do capital nas mãos, a classe burguesa fornece condições materiais favoráveis para c
ontemplar a realização de pesquisas que lhe interesse. Laboratórios, máquinas, equipamentos, mão-de-obra especializada serão utilizadas para seu próprio proveito, na divulgação, controle e aplicação dos resultados alcançados.
Na sociedade industrial, os produtos criados pela técnica caracterizam-se por afirmar uma racionalidade instrumental dos meios e dos fins. Eles implantam hegemonicamente relações mecânicas na sociedade, substitutivas de vínculos de amizade e companheirismo, componentes formadores da teia social. A crença nesta racionalidade vigente promove a extinção de espécies vegetais e animais, destruindo a rica diversidade e multiplicidade de seres existentes. Ela faz desaparecer florestas, mangues, rios, montanhas aproveitando-os somente como recursos no processo da produção industrial.
Contra esta agressividade técnico-social, poder-se-ia adotar como princípio o respeito aos ciclos ecológicos, utilizando-se mais freqüentemente da energia e dos recursos renováveis, poupando ao máximo os recursos não renováveis. Isso ocorreria privilegiando-se a produção de produtos que sejam: duráveis, de baixo consumo de energia em sua produção e funcionamento, de fácil manipulação e conserto, recicláveis e, por último, quando finalmente destruídos capazes de ser absorvido pelo meio ambiente. Esta nova forma de utilização técnico-social estaria encarnada num processo produtivo radicalmente novo, seja na forma da organização pela participação eqüitativa, descentralizada e desalienante dos próprios produtores, como na diminuição da dimensão das unidades de produção, o denominado desenvolvimento sustentável.
A autora é Graduada em Bacharelado em Turismo pela Faculdade Piauiense – FAP, pós-graduanda em Projetos Turísticos pela Universidade Gama Filho.