Eco-cidadania com rosto jovem

0
1333

Na emergência de novos direitos, face aos sérios problemas que a sociedade mundial experimenta, destaca-se a questão ambiental, que aos poucos vai configurando-se, efetivamente, como “direito verde” ou conjunto de direitos ambientais. No Brasil, a Constituição Cidadã de 1988, no seu art. 225, Cap. VI é contundente a esse respeito: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem como de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Na linha da consolidação dos direitos ambientais, a UNESCO lançou oficialmente, no dia 01 de março de 2005, a Década das Nações Unidas da Educação para o Desenvolvimento Sustentável. O principal objetivo da Década é encorajar os governos dos países membros da ONU a integrar o conceito de desenvolvimento sustentável às políticas educacionais e aos processos de aprendizagem. No Brasil, o lançamento da Década aconteceu durante o Congresso Ibero-americano sobre Desenvolvimento Sustentável 2005, que se realizou no Rio de Janeiro (RJ) nos dias 31 de maio, 01 e 02 de junho de 2005.
Ao instituir a preocupação com o desenvolvimento sustentável, a Década almeja melhorar a qualidade do ensino, facilitar a troca de experiências entre os diversos atores envolvidos e aumentar a atenção pública ao assunto. A definição de educação para o desenvolvimento sustentável ultrapassa a questão ambiental (como água, mudanças climáticas, biodiversidade, etc.) e agrega estes conceitos a aspectos econômicos para o desenvolvimento (luta contra a pobreza, transformações sociais, eco-turismo etc.) e a valores sócio-culturais, tais como igualdade de gênero, promoção da diversidade cultural e construção de uma cultura de paz. Assim, ao integrar o cuidado ambiental num conceito de paz mais abrangente, pode-se afirmar que esta não será mais somente “branca”, mas também “verde”!

crie com ia

a) Sensibilidade “verde” mais aguçada

Apesar das dificuldades de efetivação de uma autêntica Educação Ambiental (ou para o “Desenvolvimento Sustentável”, como outros preferem chamá-la), a situação ambiental caótica que todos estamos experimentando na própria pele e em nível planetário (aquecimento global), vem contribuindo para acelerar o processo de sensibilização e conscientização em torno ao cuidado do meio ambiente. Por isso hoje, mais do que nunca, proliferam movimentos e organizações não-governamentais dedicadas exclusivamente à proteção e à defesa do meio ambiente.
Este é um tempo propício para ajudar os jovens a fundamentarem a sua sensibilidade ecológica e a assumirem um compromisso permanente com o cuidado ambiental. Aliás, a inserção em movimentos ambientais é também uma forma muito atual e “diferente” de conscientização e engajamento político.
Partindo da perspectiva do cuidado ambiental como ação cidadã, efetivamente, assistimos à emergência do chamado sujeito ecológico. Esse sujeito, “concebido enquanto um tipo ideal, traduz uma subjetividade ambientalmente orientada, capaz de encarnar os dilemas societários, éticos e estéticos configurados pela crise societária em sua tradução contra-cultural, tributário de um ideal de sociedade socialmente emancipada e ambientalmente sustentável (…). O sujeito ecológico demarca um campo de ideais disponíveis para a formação identitária do jovem que ingressa na esfera pública e que partilha, em algum nível, um projeto político emancipatório. A idéia de mudanças radicais cultivada pelo ideário ecológico abarca não apenas uma nova sociedade, mas também um novo sujeito, que se vê como parte dessa mudança societária e a compreende como uma revolução de corpo e alma, ou seja, uma reconstrução do mundo incluindo os estilos de vida pessoal”.

b) Matizes no aprendizado do cuidado

Com o passar dos anos, desde o surgimento dos movimentos ambientalistas na década dos 70 e a realização de diversas Conferências Mundiais (Estocolmo, Tbilisi, Rio), o conceito de Educação Ambiental foi sofrendo evoluções. Na prática, ela segue caminhos diversificados. E isso incide também no tipo de engajamento juvenil e na identidade do chamado “sujeito ecológico”, como afirma CARVALHO (2004): “São diversos os caminhos pelos quais os jovens podem se aproximar dos valores ecológicos, identificando-se em diferentes níveis com os ideais do sujeito ecológico, uma vez que não se trata de uma identidade totalizante. Esse acercamento dos ideais ecológicos pode assumir de modo não-excludente as formas de adesão a uma luta, a uma ação, a um modo de vida ou a um interesse intelectual. Dessa forma, nomear-se ecologista ou, ao menos, ecologicamente sensibilizado/simpatizante pode ganhar os sentidos de adesão a um ideário de ação militante; pode ser uma opção de engajamento grupal pontual e distintiva; ou ainda signo descrito de um interesse ambiental que pode combinar em diferentes gradações a sensibilidade política com a escolha da formação profissional/intelectual”.
Por causa do anterior, os programas de Educação Ambiental podem seguir roteiros diferentes, dependendo do acento que eles derem a determinadas ações, situações e metodologias: “Sauvé et al. (2000,) classificam as representações ambientais em sete categorias: como natureza, como recurso, como problema, como sistema, como meio de vida, como biosfera e como projeto de vida. A síntese de cada percepção … não busca um sistema fechado de representações nem pretende se inserir na posição cartesiana de agrupar as representações sociais em pacotes fechados e sem diálogo entre si, apenas oferece uma síntese crítica que possa contribuir com o debate sobre as representações do ambiente (Sato, 2001)”.
Segundo a mesma autora, “a categorização aqui apresentada não está concluída é que uma ação ou pensamento pode estar conectado com o outro. Igualmente, não existe “certo” ou “errado”. São apenas concepções sobre o mundo, as quais podem manter diálogos ou buscar interface, e uma pessoa pode utilizar uma técnica ou outra, através da ação e da reflexão. Ou, como consideram Caride & Meira (2001), “são momentos, inclusive, para rever nossas representações”.
Contudo, seja qual for o tipo de Educação Ambiental que os grupos, movimentos juvenis e organizações não governamentais quiserem seguir, eles não deverão desconsiderar as recomendações da Agenda 21 e os princípios da Carta da Terra (o respeito e a manutenção de todas as formas de vida, a integridade ecológica, a justiça social e econômica, a paz, a democracia e a não-violência).

c) Pauta e currículo sócio-ambiental

Certamente, para sustentar e alicerçar as práticas e o engajamento “eco-cidadão” dos jovens, será preciso integrar adequadamente a dimensão da Educação Ambiental no seu processo formativo, ajudando-os a adquirir um mínimo de conhecimentos, de habilidades e de sensibilidades, complementando, numa perspectiva libertadora, a reflexão e a práxis em torno à totalidade da questão ambiental nos seus aspectos biofísicos e sociais. Ou, como bem dizem os jovens num jargão mais popular: “cuidar do meio ambiente é cuidar da nossa gente!”.
Uma ampla temática pode servir como pauta formativa válida, sempre e quando forem feitas as devidas adaptações e complementações, conforme a realidade de cada grupo e as novas descobertas das ciências: distinção entre ecologia e meio ambiente; desenvolvimento sustentável; paradigma do cuidado; teoria da Gaia; conferências ambientais, Agenda 21; a Carta da Terra; meio ambiente e relações de gênero; critica do conceito de desenvolvimento e do modelo desenvolvimentista implantado no Brasil; aquecimento global; escassez e poluição dos recursos hídricos; enchentes; poluição do ar; deserto verde, desmatamento e incêndios florestais; problemas dos biomas brasileiros; biodiversidade e biopirataria; grilagem de terras; agronegócio; sojicultura; eucalipto e bio-combustíveis; conflitos agrários; extração predatória de madeira; siderúrgicas e produção ilegal de carvão; terras públicas e mineração; Base de Alcântara; impactos sócio-ambientais de grandes obras de infra-estrutura; etc.

Autor: Gustavo Covarrubias Rodríguez

Referências Bibliográficas:

i CARVALHO, Isabel Cristina. Ambientalismo e juventude: o sujeito ecológico e o horizonte da ação política contemporânea. In NOVAES (2004), pp. 71-72.
ii Ibid, p. 71.
iii SATO, Michele. Educação Ambiental. São Carlos: Rima Editora (2004), p. 11.
iv Ibid., p. 12
v Às vezes, para designar a sensibilidade ambiental, usa-se muito o conceito paradigmático do “cuidado”.

LEAVE A REPLY

Please enter your comment!
Please enter your name here